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Que absurdo de boa ação!

Geralmente fazemos uma leitura da Bíblia ocidentalizando as emoções registradas em determinadas passagens.

Há autores (bíblicos) que, inclusive, não explicitam tantos detalhes afetivos em seus textos, visto que nenhum deles cria que os escritos sobreviveriam por tanto tempo e fossem lidos em terras tão distantes. Ora, não era necessário, portanto, detalhar sentimentos, ações e todos os panos-de-fundo da história, pois seus leitores contemporâneos reconheceriam de pronto. 

É também por isso que hoje existem os historiadores, exegetas, que buscam o "mundo-da-vida" daqueles tempos. Perder o sentido daqueles escritos poder ser uma tragédia ambígua para nossos dias. 

Mas entender textos antigos é um exercício e tanto. Alguns são possíveis, outros permanecerão na esteira das tentativas e das especulações.

O texto de Mateus 26: 6-13 é dor de cabeça para alguns. Em Mateus, o evento ocorre dois dias antes da Páscoa, em João 12, seis dias. Mas a cronologia não será nosso foco por aqui. Estamos falando de sentimentos do "mundo-da-vida" de lá tentando resgatar alguma coisa que se possa melhorar o mundo-de-cá.

No final do capítulo 25, Jesus discursa sobre o Reino na perspectiva humana, onde Deus deve ser visto no outro que necessita de algo para sobreviver. Fala sobre buscar servir a Deus no outro a fim de gerar vida naquele que está morrendo. Alguns elementos são apresentados por Jesus: comida, bebida, roupa, auxílio ao doente e preso. O judeu via isso como boa ação e, esta boa ação, era como um tipo de "esmola".

Havia uma outra boa ação, que era praticada para embalsamar e/ou cuidar do corpo dos mortos. Esta era superior àquela. 

Quando os discípulos veem a mulher derramando o nardo puro, importado da Índia, cujo conteúdo deveria ser utilizado por completo após quebrar o jarro para não perder suas propriedades químicas, fazem a ligação do discurso anterior com aquela cena e criticam a ausência da crítica de Jesus: "Como o Senhor pode deixar que isso aconteça? Acabaste de nos ensinar sobre o Reino, sobre o cuidado que temos de ter com os pobres, com os necessitados, a fim de trazer vida aos necessitados? Esse é um dinheirão perdido!"

Há ofertas e ofertas! Há cuidados e cuidados! E, em se tratando de uma preparação para a morte, vale mais. Preparar as pessoas para morrer é uma questão de adoração.

Notemos: Jesus está em Betânia. Lugar onde está sendo ameaçado de morte. Está em casa de Simão, o que outrora era destituído de identidade social, pois era leproso. E, em meio à mesa, aproxima-se uma mulher. Uma mulher - um escândalo! Por ali, os discípulos, que estão aprendendo a ajudar os outros através do discurso do Mestre, mas que acabam por interpretar o mundo-do-Reino erroneamente naquela casa. 

Jesus, olhando para os discípulos não refaz sua fala, mas esclarece ainda mais sobre a solidariedade que devem ter no caminho da vida. As prioridades, os valores, as doações, o dar-se. 

Se não é suficiente para dar-se, dê tudo a quem poderá fazê-lo.

Está aí uma boa ação que podemos fazer: se não sabemos doar a nós mesmos aos outros em amor, doemos o que temos aos que assim o fazem. Talvez, quando nada daquilo que tínhamos - e que por aquilo éramos possuídos -, não mais existir em nós - ou não mais existirmos naquilo -, possivelmente teremos apenas a nós mesmos para entregar. Essa é a potência do amor, da boa ação: entregar a nós mesmos. Enquanto isso, temos de entender que somos aqueles que não compreendem de todo as palavras do Mestre.

NA GRAÇA
LELLIS



 


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