Pois é, a impressão que se tem é que a igreja se tornou defensora de Deus e esqueceu-se de si mesma. Ela - a igreja - advoga uma causa quase perdida diante dos intelectuais da realidade. Oh, e quem poderá ir contra a realidade? Ficamos aqui, tomando um cafezinho, assistindo o mundo eclesiástico a defender a moralidade da fraqueza, como já dizia Nietzsche.
Tem gente que morre pela "causa" de Deus. Tem gente que adoece pela "causa" de Deus. E caso não sofra, há um problema espiritual aí - logo é julgado. E se não aprendeu a sofrer, acaba sofrendo porque não sofre. Trata-se de um sofrimento normativo. Precisa chorar, lamentar, se matar... matar, se for preciso. Afinal, é o "nome de Deus" que está em jogo; é a causa do Mestre! Às espadas, então!
Meu Deus, que loucura!
Se for necessário, o pai leva o filho ao altar como Abraão pra mostrar que sua fé está acima de qualquer coisa. E não duvidemos, ele sacrificará em holocausto. Se necessário, a gente mata a família por causa dos incalculáveis compromissos pastorais. Ah, se não! A preocupação é a manutenção da imagem de Deus em nós. Por isso, se faz tanto. Não é por amor às pessoas, é porque Deus simplesmente mandou amar. É por isso que se ama mais os de fora, para manter a imagem de Deus em nós. Os de casa? Ixi... lá não precisa fazer manutenção da imagem de Deus. Lá, Deus tem que ser comido e bebido em silêncio. Às vezes, se quebra o pau, outras vezes, se perdoa pra tentar manter a imagem. Tudo pela causa de Deus.
É esse sacrifício lamentável em que muitos se entregam. É uma luta pela defesa de Deus, pela prova de Deus, pelo tão pregado testemunho ao outro. Vive-se por uma ética determinista, de uma verdade a qualquer preço, mesmo que esse preço seja a perda de vidas - pelas quais (numa visão cristã) o próprio Cristo se deu de uma vez por todas (e uma visão criticada pelo próprio Nietzsche).
Daí, esse negar a si mesmo, dito por Jesus, vai tomando uma outra conotação pelos cristãos: "negar o eu". Como negar o eu? Como?
A proposta do negar o "si mesmo" é sobre o construto, não sobre a própria persona. Não é matar os sonhos, os desejos, os poemas, o cântico dos cânticos. É reavaliar o totem, as prioridades e tentar nutrir tão somente os planos e reações que gerarão vida.
Quem sou eu para dizer o que Deus quer, mas ao menos sou impaciente e tento lidar com as ideias sobre o que Deus não quer. E se sou humano, e se estou vivo, e se é correto afirmar essa vida abundante, não quero outra coisa a não ser: ser eu mesmo. E continuo crendo nas palavras de Sören Kierkegaard que, quanto mais próximos de Deus, mais parecidos conosco mesmo ficamos.
Portanto, não quero advogar a Deus, não quero morrer brigando por causa de Deus. Quero ser eu mesmo. E, sinceramente? Se cada um se esforçar pelo "eu mesmo", quem sabe a gente não O veja uns nos outros?
NA GRAÇA
LELLIS
5 comentários
Amado Nelson!!!
Como sempre falando o que precisamos ouvir ou que não temos muitas vezes de dizer!
O meu pedido é o mesmo! Deixe eu ser eu mesma!
"quanto mais perto de Deus, mais parecidos conosco mesmo ficamos."
isso é algo que estou ainda tentando entender, não sei ainda quem eu sou, tenho medo de descobrir.
como vc mesmo ja me disse uma certa vez, "buscamos a Deus para conhecermos a nós mesmos".
Disse que faço teologia para conhecer a mim mesmo. E a busca em conhecer a Deus o que seria senão conhecer o discurso sobre Deus? Pois seria o contato "com" ou o discurso "sobre" que teria o poder para mudar o homem?
Se quisermos brincar de oráculos de Deus, discurso; se quisermos brincar de fenomenologia, contato. Eu, vou brincando de teologia.
É realmente me vejo frequentemente tentando fazer a defesa de Deus, como se Ele precisasse de advogados, mas é tão incontrolável e reativa essa defesa.Cada vez escrevendo mais complexo Nelsim, mas é sempre libertador ler seus artigos.Essa frase do fim descreve tudo,quanto mais perto de Deus mas perto de nós mesmo ficamos.Mais ainda há mta caminhada pela frente em busca do meu eu.E vc sempre me ajuda mto nisso ;) Abraço
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