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Uma visita, Romanos 8 e o temor de um velho

Fui visitar a uma senhora num bairro bem carente. Ela faz diálise. Seus rins não funcionam e sua dispensa, quase zerada. Já não consegue mais movimentar o lado direito e a fala está comprometida. A expressão que o médico usou foi: “Não adianta. Até o seu coração está podre”. Sem termos técnicos, sem esperança, sem misericórdia. Ela, com seus sessenta e poucos anos e o marido, menos velho, mas duro, sem muito tato, sem muita delicadeza.


Um gatinho na cama era a melhor companhia. Ele estava lá. Enrolado no braço direito, o que perdera toda a sensibilidade. Mas estava lá.

Carregamos várias doações para a dispensa, inclusive remédios, além de informações importantes sobre o que perguntar aos agentes de saúde e o que fazer na ausência desses. Li Romanos 8: “nada poderá nos separar do amor de Deus que está em Cristo Jesus”. A gente sempre lê Romanos 8. O que interessa é falar do amor. Ainda bem que esse amor veio acompanhado na visita através de comida, remédio e atenção, caso contrário, Romanos 8 seria uma heresia.

O amor de Deus é sempre acompanhado de atitudes. Deus provou o amor pelo fato de Cristo ter morrido na cruz. E a igreja prova que isso teve impacto quando demonstra que é capaz de descer de sua glória, de sua espiritualidade impecável e totalmente santificada, a fim de morrer pelos que perecem.

Morremos a cada dia em que nos doamos, em que nos desfazemos para construir no outro, em que deixamos a igreja para sermos igreja. Quanto temor há em nós?

Houve certo temor que chamou a atenção naquela casa ao orarmos. Um primo da família, 74 anos, incomodado enquanto eu falava, pediu-me licença para tirar um papelote que usava para enrolar o seu fumo. Ele não queria orar com aquilo no bolso da camisa. Ao retornar, oramos. Aquele senhor, levando seu lenço ao rosto, chorava copiosamente e enxugava as lágrimas por sentir algo que nem eu mesmo sentira. Era um temor diferente do meu, mais agudo, mais profundo, mais constrangedor. Eu lia, ele conseguia ouvir o que eu não ouvia enquanto lia; eu orava, ele conseguia chegar aonde minha oração pretendia chegar.

Não demonizei o seu fumo. Não tive forças para isso, nem capacidade. Não consegui olhar para aquele homem como alguém que simplesmente desejava ser liberto de algo que prejudicava sua saúde, mas um senhor, cuja experiência de vida, já vira muitos casos como aquele (da senhora) e ainda assim, se sentia na obrigação de crer na cura, na vida. Era um velho que debruçara todas as suas emoções naquela oração, naquele quarto quente e apertado, diante da invalidez daquela senhora.

Somos o que somos. Não há como fugir de nossa tão sensível e misteriosa humanidade. Somos um grão. Somos gigantes. Somos enfermos. Somos curados.

O que aprendi com isso? Que nada pode nos separar do amor de Deus. Ele é nosso, assim como todas as precariedades que a carne pode alcançar. Que haja ao menos o temor do velho: “sei quem sou, sei do que falam e do que demonizam em mim, mas não caio no engano de dizer: ‘o Senhor aqui estava e eu não sabia’”.

NA GRAÇA,

LELLIS

2 comentários

Mariáh disse...

Lindo, lindo! Quase chorei aqui.
O amor de Deus é perfeito, e sempre que leio/ouço/presencio essas histórias de quebrantamento, eu choro. Seja por dentro ou por fora.
Porque é lindo demais! Deus é demais, né?

Morgana disse...

Lindo e tão expressivo esse texto.Pude imaginar o ocorrido em minha mente.
Só o amor de Deus mesmo.Que nos preenche,que nos cura e que nos chama a sermos melhores do que a nossa carne nos motiva a ser.Jamais conseguirei tatear esse tão imenso amor,a não ser na glória,quem sabe.É esse amor que nos mantêm em pé.

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