
O estudo realizado pelo Dr. Júlio P.T. Zabatiero trabalha com a construção de identidade e identificação (o texto está na íntegra no livro: "Espiritualidades à mesa - regras de etiqueta", organizado por mim).
Sempre que Deus quis ser entendido, usou da linguagem e formas humanas (antropomorfismo) para que todos pudessem acessar ao seu propósito e vontade. O texto abordado trata dessa construção, dessa linguagem pragmática (Pragmática – no sentido dos fatores contextuais que determinam os usos linguísticos nas situações de comunicação), dessa libertação completa do cativeiro do corpo e do espírito.
O regresso dos judeus após o cativeiro da Babilônia é narrado em Isaías 40-55, que constitui a segunda parte do seu livro, por isso é chamado de “Segundo Isaías” ou “Dêutero-Isaías”. O profeta a quem chamamos de “segundo Isaías” exerce seu ministério profético durante a última parte do exílio babilônico, exortando os judeus a não desanimarem. Javé é apresentado como o Criador do céu e da terra, Senhor da vida e da História, o Único e Soberano Deus; diante dEle todos os deuses babilônicos, a começar por Marduk, nada são e nada valem. O livro se divide em duas partes: Deus Libertador (40:1-48:22) e Restauração de Sião (49:1-55:13).
O “Segundo Isaías” descreve o segundo êxodo como superior e mais glorioso que o primeiro, o de Moisés; da História concreta passa à Teologia do Deus criador e salvador, de modo que a Teologia comanda a História, pois tudo depende do mistério da vontade divina, inscrito no centro da mesma História. É o primeiro evangelista da História da Salvação, que anuncia a Boa-Nova da salvação-libertação com imagens e símbolos que ultrapassam qualquer história. Destacam-se nele os famosos Cânticos do Servo (Conf. Isaías 42; 49; 50:4-9; 52:13-53:12), que se integram nas duas partes deste livro: 40-48 e 49-55. O autor é mais poeta e teólogo que historiador. De fato, o estilo do “Segundo Isaías” é muito diferente do “Primeiro”, pois quem impera e tudo comanda no “Segundo” é a retórica ao serviço da Teologia e da Fé. Nota-se que o primeiro Isaías é mais templário e não combina com o “profeta (quase) independente” do segundo.
O livro do Segundo Isaías registra a memória de fé e esperança do povo judeu, empobrecido e escravizado, durante o exílio da Babilônia. Em meio à realidade de miséria e opressão, pessoas simples se solidarizam umas com as outras para superar o desafio da sobrevivência e do sofrimento. A convivência solidária faz brotar a experiência da misericórdia e da ternura de Deus, que nunca abandona seu povo. A aproximação de Ciro, rei da Pérsia, possibilita vislumbrar a derrota da Babilônia. A comunidade vê nesses acontecimentos a mão poderosa de Javé a conduzir a história, e começa a sonhar com a volta. Mas como organizar a nova sociedade? A experiência do exílio desperta a consciência de uma liderança baseada na justiça e na solidariedade. O projeto é reconstruir Jerusalém e partir de uma nova ordem social (Shigeyuki Nakanose; Enilda de Paula Pedro – Como ler o Segundo Isaías 40-55; Ed Paulus).
Essa nova ordem social dependia de uma nova visão diante do emaranhado espiritual em que o povo escolhido se encontrava. Por isso, o “segundo Isaías” é erguido. O pesquisador Colli disse que “as pessoas têm um entendimento errado sobre o que é o profeta bíblico. Ele não é o sujeito que fecha os olhos e de repente vê, em detalhes, o que vai acontecer dali a centenas de anos. O profeta é aquele que vê o futuro, mas sempre a partir do presente. Ele olha o presente, analisa e indica o que a vontade divina releva”(COLLI, G. A. “O prólogo de Dt Is: Is 40,1-11 - Dinâmica profética através da memória do êxodo”). Foi o que aconteceu. O profeta utilizou o contexto histórico para apresentar Javé ao seu povo. O desafio era submeter os pensamentos ao padrão absoluto de Deus e que suas consciências estivessem cativas à soberania desse único Deus.
O desafio, na realidade, era combater os falsos deuses diante de um povo, cujas portas do cativeiro se encontravam abertas. Seus corpos estavam livres, porém, o desafio era libertar a consciência do povo. Ora, Javé sempre estará à altura dos desafios da realidade, porque sempre será Deus Soberano e Criador de todas as coisas. Entra reino e sai reino, o Senhor é Rei para sempre (Dn 7:14).
NA GRAÇA,
LELLIS
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